João Bento não tem a mesma relação com a Matemática na sala de aula da escola secundária que frequenta em Abrantes. No segundo período teve negativa.
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Nasceu a 17 de Outubro de 2001 ou, dito de outra forma, tem 12 anos, sete meses e poucos dias – um arredondamento pouco preciso e que, por isso, já é menos do agrado de João Bento. Afinal, acaba de conquistar o primeiro lugar no concurso de Matemática Supertmatik, o que lhe valeu o título de Campeão Mundial de Cálculo Mental.
Um feito que conseguiu depois de, em 42,5 segundos, ter resolvido as dez contas que lhe foram apresentadas, num tempo recorde que lhe permitiu ficar à frente de um sul-coreano e de um indiano, superando 36.725 finalistas de 61 nacionalidades.
Desde cedo, João mostrou um grande interesse pelos cálculos e pelas datas. É uma verdadeira agenda da família, conta a mãe, Maria João Bento, que salienta que o filho é “um menino como os outros”, apenas se destaca nesta área. Sabe de cor a data da morte de várias celebridades, como a de Nelson Mandela, e em segundos relacionou que um familiar teria acabado de completar 100 anos no dia em que nasceu uma prima. O segredo? João encolhe os ombros e com um sorriso malandro diz que não sabe explicar: “Não é um truque. Se calhar a minha forma de pensar é que é mais rápida.”
Da mesma forma que não sabe justificar bem as razões que o levam, dentro da sala de aula, a não ter a mesma relação com a Matemática: no último período teve nota negativa, mas está a dar a volta e acredita que para o ano vai chegar ao 5 e surpreender a Escola Secundária Dr. Manuel Fernandes, em Abrantes, onde frequenta agora o 6.º ano.
No sofá da sua casa em Alferrarede, no concelho de Abrantes, João mostra ao PÚBLICO em que consiste o jogo Supertmatik, a que começou a dedicar-se em 2011, depois de o ter recebido como presente de Natal oferecido por uma tia. Com as pernas irrequietas a balançar, espalha as cartas com as equações no sofá. De um lado aparecem as contas a que deve responder consoante o nível em que está, no verso o resultado. Perante os primeiros desafios, os olhos claros brilham e o sorriso ilumina-se. Quanto é 35 vezes dois, menos noventa a dividir por três? João responde prontamente “Super T 40”. E 23 vezes três, menos zero, vezes 23? Não hesita e diz “Super T 69”. Na terceira tentativa ainda estamos a ler a conta quando João dá o resultado.
Entrada no campeonato mundial
O menino garante que é devido ao treino que está mais rápido e adianta que os colegas lhe pedem ajuda e que se metem com ele por causa dos cálculos. Até na rua já lhe lançaram desafios em jeito de bom dia. No ano passado já entrara no concurso mas sem conseguir chegar aos primeiros lugares. Neste ano voltou a conquistar os melhores lugares na turma, na escola e garantiu, depois, entrada no campeonato mundial.
Foi através do computador do professor de Matemática que, online, usou as suas três tentativas para concorrer, conseguindo numa delas o tempo que lhe valeu o título. “Faço isto para descansar a cabeça e descontrair. Gosto de treinar. A fazer outros exercícios estou sempre distraído e com os cálculos não, nem olho para a televisão”, conta, explicando que nas aulas se distrai mais e que acaba por ter resultados menos bons com a falta de concentração e por nem sempre interpretar bem os enunciados dos exercícios.
O professor de Matemática de João não falou ao PÚBLICO mas, à Lusa, explicou que têm trabalhado com o aluno e que os resultados estão a melhorar. As dificuldades a Matemática são, aliás, comuns na idade de João. No ano passado, por exemplo, a média nacional do exame de Matemática do 6.º ano ficou-se pelos 49%, depois de no ano anterior ter sido de 54%. João fez neste ano a prova mas só sabe os resultados em Junho.
“O problema é que as pessoas não conseguem projectar os exercícios para a vida real. Acho que é o que acontece também na escola, em que alguns alunos demoram mais a perceber como as coisas encaixam”, completa o pai de João, Jorge Bento, que faz questão de dizer ao filho que “a Matemática e a Física estão todos os dias na nossa vida” e de o ajudar a melhorar com exemplos práticos. De todas as formas, acredita que, mais importante do que pensar agora em “ser doutor, engenheiro ou arquitecto”, é que João continue a ser uma criança feliz, experimentando as actividades próprias da idade, tal como os outros três filhos do casal.
Estudar “ás vezes”
Por agora, jogar à bola, natação e hóquei em patins são as actividades predilectas, assim como encarnar um super-herói no jogo online Hero Zero, onde se apresenta com um nome premonitório: Invencível 2. Quanto a estudar, o “às vezes” é a expressão escolhida pelo aluno para descrever a dedicação e adianta que a melhor nota é a Educação Moral – pelo que o pai lhe lembra que “tem de ser bom a vida toda e não só na escola”. Quanto ao futuro, João diz que não sabe bem o que quer ser. Já pensou em sucateiro e jogador de hóquei, mas acha que é cedo para decisões, ainda que não exclua vir a ajudar o pai nas contas da sua empresa de construção.
Para o último período de aulas, João está mais confiante nos resultados escolares. “O jogo deu-me um pouco de motivação e esta vitória também. Acho que agora vou ter positiva a Matemática, já que as fracções e problemas com volumes estão a correr um bocadinho melhor. Para o ano gostava de ter um cinco [a nota máxima na disciplina] e de ir outra vez aos mundiais de Supertmatik”, afirma, ao mesmo tempo que confessa que – por agora – os intervalos e as “miúdas” são o melhor da escola. De tal forma que, para contornar eventuais atrasos das irmãs, de manhã até prefere apanhar um autocarro e ser o primeiro a chegar.