A solvabilidade da economia portuguesa deixou de ser uma dúvida metafísica. A questão nem é se isto pode acontecer-nos, é isto estar a acontecer-nos e nós negarmo-nos. A vitimização nunca salvou nenhuma vítima.
É abrir a janela e ouvir a algazarra. Jornais influentes, presidentes, prémios Nobel, economistas, credores e investidores dizem que Portugal é a peça seguinte do dominó grego. E nós? Dizemos que o mundo inteiro se uniu para nos tramar. Respondemos com insulto.
O novato PSD continua a usar o PEC como arma de derrube. O velho Governo amua e convoca os economistas portugueses para um jogo contra o resto do mundo. Crêem mesmo que o melhor é não falar disso, para não chamar as atenções estrangeiras. Mas é ao contrário! Toda a gente fala disso menos nós. Portugal é, como na anedota, o maluco internado no hospício que do quarto diz para a rua: “Vocês aí dentro estão todos loucos.”
Está na altura de deixar de ter medo de ter medo: Portugal está à beira da bancarrota? Portugal pode sair da Zona Euro? A Zona Euro está em risco? Provavelmente, não, não e não. Mas, há dois meses, não era preciso dizer “provavelmente”.
Portugal está a ser alvo de ataque dos especuladores. É verdade e é inútil dizê-lo. Os mercados continuam a decidir países, prova do fracasso da luta dos Estados contra a “especulação”. Mas nós pusemo-nos a jeito, estamos vulneráveis. Somos animais doentes sob o olhar dos necrófagos. E as injustiças não pagam dívidas.
A situação da nossa economia é muito grave (ver detalhe a páginas 4 a 7). Mas sempre achámos que nos emprestariam dinheiro: ser “euro” era garantia eterna. O problema seria, pois, o preço do dinheiro, nunca haveria restrição.
O pressuposto pode estar errado. E, se o estiver, nós não seremos troianos, seremos tão gregos como os outros.
O processo de desendividamento, que nos prometeram como catástrofe compassada, ainda não começou. A economia portuguesa ainda não reduziu o seu nível de endividamento. É por isso que já contrai dívidas apenas, e só, para pagar dívidas. Que privatiza tudo por um ano de juros.
A questão é difícil mas, no fundo, simples: Portugal não enfrenta a bancarrota excepto se os credores acreditarem nisso, altura em que deixam de emprestar dinheiro e… entramos em bancarrota.
O cenário de exclusão do euro é ainda menos provável. Não por nós, mas pelos alemães. Mas na Germânia já não se está pelos ajustes. “E se for a Alemanha a sair do euro?”, perguntou-se já. A Zona Euro enfrenta agora o seu primeiro grande choque e terá de resistir à desagregação. Mas é este o nível em que a conversa está.
O problema de liquidez que a economia portuguesa pode enfrentar resulta de movimentos oportunistas dos mercados. Mas a questão subjacente, e estrutural, é da economia: é de solvabilidade.
Como explicamos hoje, a saída do euro obrigaria Portugal a um choque súbito e brutal. Mas há outros cenários menos radicais mas também dolorosos, como a baixa generalizada de salários.
Falar disto não é alarmismo, é abrir os olhos. Falhámos em tomar conta de nós mesmos, agora outros poderão tomar-nos a soberania económica.
Talvez seja disso que precisamos. Podemos fugir à realidade mas a realidade não fugirá de nós. Nós não estamos a controlar esta crise. A crise é que está a controlar-nos.
Pedro Santos Guerreiro
É abrir a janela e ouvir a algazarra. Jornais influentes, presidentes, prémios Nobel, economistas, credores e investidores dizem que Portugal é a peça seguinte do dominó grego. E nós? Dizemos que o mundo inteiro se uniu para nos tramar. Respondemos com insulto.
O novato PSD continua a usar o PEC como arma de derrube. O velho Governo amua e convoca os economistas portugueses para um jogo contra o resto do mundo. Crêem mesmo que o melhor é não falar disso, para não chamar as atenções estrangeiras. Mas é ao contrário! Toda a gente fala disso menos nós. Portugal é, como na anedota, o maluco internado no hospício que do quarto diz para a rua: “Vocês aí dentro estão todos loucos.”
Está na altura de deixar de ter medo de ter medo: Portugal está à beira da bancarrota? Portugal pode sair da Zona Euro? A Zona Euro está em risco? Provavelmente, não, não e não. Mas, há dois meses, não era preciso dizer “provavelmente”.
Portugal está a ser alvo de ataque dos especuladores. É verdade e é inútil dizê-lo. Os mercados continuam a decidir países, prova do fracasso da luta dos Estados contra a “especulação”. Mas nós pusemo-nos a jeito, estamos vulneráveis. Somos animais doentes sob o olhar dos necrófagos. E as injustiças não pagam dívidas.
A situação da nossa economia é muito grave (ver detalhe a páginas 4 a 7). Mas sempre achámos que nos emprestariam dinheiro: ser “euro” era garantia eterna. O problema seria, pois, o preço do dinheiro, nunca haveria restrição.
O pressuposto pode estar errado. E, se o estiver, nós não seremos troianos, seremos tão gregos como os outros.
O processo de desendividamento, que nos prometeram como catástrofe compassada, ainda não começou. A economia portuguesa ainda não reduziu o seu nível de endividamento. É por isso que já contrai dívidas apenas, e só, para pagar dívidas. Que privatiza tudo por um ano de juros.
A questão é difícil mas, no fundo, simples: Portugal não enfrenta a bancarrota excepto se os credores acreditarem nisso, altura em que deixam de emprestar dinheiro e… entramos em bancarrota.
O cenário de exclusão do euro é ainda menos provável. Não por nós, mas pelos alemães. Mas na Germânia já não se está pelos ajustes. “E se for a Alemanha a sair do euro?”, perguntou-se já. A Zona Euro enfrenta agora o seu primeiro grande choque e terá de resistir à desagregação. Mas é este o nível em que a conversa está.
O problema de liquidez que a economia portuguesa pode enfrentar resulta de movimentos oportunistas dos mercados. Mas a questão subjacente, e estrutural, é da economia: é de solvabilidade.
Como explicamos hoje, a saída do euro obrigaria Portugal a um choque súbito e brutal. Mas há outros cenários menos radicais mas também dolorosos, como a baixa generalizada de salários.
Falar disto não é alarmismo, é abrir os olhos. Falhámos em tomar conta de nós mesmos, agora outros poderão tomar-nos a soberania económica.
Talvez seja disso que precisamos. Podemos fugir à realidade mas a realidade não fugirá de nós. Nós não estamos a controlar esta crise. A crise é que está a controlar-nos.
Pedro Santos Guerreiro